quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

40. Seguir ou Continuar



«Para já, Luís Ribeiro e Mica, mais dois atletas cedidos pelo Sporting, seguem em Huelva».
O Jogo, 31 de dezembro de 2015, p. 9.

O verbo «seguir» em espanhol traduz-se em português por «continuar». Aquele «seguir» é um «falso amigo» ou falso cognato. Os atletas cedidos pelo Sporting «continuam» em Huelva e não «seguem» em Huelva. É provável que a notícia tenha sido respigada de algum jornal espanhol e que isto resulte de uma tradução descuidada. Registe-se, porém, que nem o contexto foi suficiente para interpelar quem redigiu o texto, sinal de alguma contaminação lexical entre o espanhol e o português...

domingo, 27 de dezembro de 2015

39. Sobre ou Sob (2)


«aconselha-se [...] a não conduzir sobre o efeito do álcool»
Oficial da GNR, a propósito da operação Natal 2015.
3 às 16 Notícias, RTP3, 26 de dezembro de 2015, 16h05.

Já por aqui se abordou o tema. O que ali se queria dizer era «sob» - ou seja «debaixo de» - do efeito do álcool, e não «sobre». Como também já se disse as preposições «sob» e «sobre» são antónimas: «sobre» é «por cima de» e «sob» é «por baixo de». «Sob» provém da preposição latina «sub», «sobre» provém da preposição latina «super». «Sub-» como prefixo ou elemento de composição surge em palavras como: subaquático ou subterrâneo; e «sobre-» em palavras como sobreloja ou sobretaxa. Na dúvida, raciocina-se por analogia...

38. Tratam-se ou Trata-se (2)


«As polícias nacionais estão de mãos atadas, pois tratam-se de crimes supranacionais, onde quase sempre é impossível chegar à identidade dos criminosos [...]»
«Buraco negro». Expresso, Revista, 23 de dez. de 2015, p. 43.

Já por aqui se disse que o verbo «tratar», sempre que acompanhado da preposição «de», é impessoal, pelo que apenas se flexiona na 3.ª pessoa do singular. Na frase, não tem, pois, de concordar com «crimes». A frase correta teria de ser: 
«As polícias nacionais estão de mãos atadas, pois trata-se de crimes supranacionais [...]». 
Conjugado pronominalmente e com o sentido de «dizer respeito a», o verbo «tratar» emprega-se apenas na 3.ª pessoa do singular. Se a leitura pode - para alguns - encontrar ali um escolho, então o melhor será mesmo reformular a frase, por exemplo:
«As polícias nacionais estão de mãos atadas, pois estes são crimes supranacionais [...]».

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

37. Returno ou Regresso



«A revista “Variety” resume os seus sentimentos em relação ao episódio que cronologicamente se segue a “O Returno de Jedi” [...].

O filme da saga Guerra das Estrelas a que a notícia se refere é o O regresso de Jedi. Ainda se podia entender - numa tradução mais literal - que fosse O retorno de Jedi, do inglês Return of the Jedi. Agora o Returno de Jedi é que não lembra a ninguém. «Retorno» é «regresso», «returno» é um novo turno. É palavra com curso no Brasil, usada no socioleto do desporto com o significado de «segunda volta».

domingo, 13 de dezembro de 2015

36. A fim ou Afim




«Dei várias entrevistas afim de fazer a produção prévia do projeto».
Entrevista do ator Pedro Carvalho, que se encontra no Brasil a gravar Escrava Mãe, uma prequela de Escrava Isaura, Metro, 11 de dezembro de 2015, p. 2.

«Vivemos na esquizofrenia de defender a estrutura social e reagir contra ela, afim de a transformar».
Entrevista a Alberto Manguel, Expresso, Revista, 12 de dezembro de 2015, p. 19.

Deparei com este «afim» em dois seguidos, em dois jornais diferentes, ambos em entrevistas, o que me leva a questionar se as transcrições das mesmas não serão feitas por gente com menos preparação?!... 
«Afim» é um adjetivo e refere-se a algo semelhante, com afinidade, com ligação (ex.: «PS e PSD têm políticas afins»). «A fim de» é uma locução e significa «para», «para que», «com o fim de» (ex.: «Saiu pelas traseiras, a fim de não ser visto»). 
Assim,  em ambas as frases teria de ficar:
  • «Dei várias entrevistas a fim de [= para] fazer a produção prévia do projeto».
  • «Vivemos na esquizofrenia de defender a estrutura social e reagir contra ela, a fim de [para]  a transformar».

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

35. Compreensível ou Compreensivo


«Um estudo, publicado no site Plos One, comprova que aqueles que leem o livro em papel são mais compreensíveis e sensíveis do que aqueles que usam um aparelho digital, e sabemos que compreensão e sensibilidade podem ser mais atraentes que um olhar 43».

«Compreensível» é «aquilo que pode ser compreendido», aquilo que é inteligível. «Compreensivo» é «aquele que compreende ou consegue compreender o outro» («fulano é compreensivo»). «Compreensível» pode aplicar-se a objetos («aquele livro é compreensível») ou a atitudes, comportamentos, reações («a atitude de x é compreensível» ). «Compreensivo» aplica-se a pessoas. Alguém «compreensivo» é alguém que compreende. Alguém «compreensível», ainda que pouco usado para qualificar pessoas, poder-se-á, quando muito, referir a alguém que podemos compreender ou entender. O que se queria referir ali era claramente que quem lê livros em papel é mais «compreensivo», ou seja, é alguém com melhores capacidades para compreender/entender/aceitar os outros, alguém mais tolerante, alguém mais compassivo.

sábado, 21 de novembro de 2015

34. Deslise ou Deslize


«Em Português, se faz favor, de Helder Guégués, é de facto um guia fundamental para escrever bem, e quando ontem lhe peguei surpreendi-me a abanar a cabeça, descobrindo-me pecador de "Alguns erros mais comuns". Daí que o remédio será lê-lo de fio a pavio e tê-lo à mão para evitar deslises».
José Rentes de Carvalho, Tempo contado, «Sem favor, antes grato», 18 de novembro de 2015.

Não resisto em partilhar esta, não tanto para assinalar o erro. Mas porque o erro ocorreu numa palavra que significa justamente erro e é usada num contexto em que o erro é de português... Na realidade «deslise» grafa-se «deslize». O erro, relativamente comum, ocorre pelo facto de haver muitas palavras em que o «s» tem o valor de «z», ainda que isso aconteça entre vogais. Registe-se que se usa «z» na maior parte dos verbos terminados em «-izar» e em palavras da mesma família: «ajuizar» e «juízo», «civilizar» e «civilização», «finalizar» e «finalização», «organizar» e «organização», «realizar» e «realização», «utilizar» e «utilização». E obviamente «deslizar» e «deslize».

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

33. Obrigado ou Obrigada


O presidente do BCP termina a sua intervenção à saída do Palácio de Belém com um sonoro e bem pronunciado: «Muito obrigada».
Nuno Amado, RTP18 de novembro de 2015

«Muito obrigado» tem ali o valor de «estou-vos agradecido/reconhecido/grato [por me ouvirem]» pelo que tem de concordar em género com a pessoa que agradece: Nuno Amado dirá «muito obrigado»; se fosse uma mulher diria, «muito obrigada. Neste último caso, ou seja, dito por mulher, e entendido como uma interjeição, ainda poderia ser «muito obrigado». Mas dito por Nuno Amado nunca pode ser «muito obrigada», só pode mesmo ser «muito obrigado».

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

32. Sobre ou Sob (1)


«O julgamento [de Luaty Beirão e demais "arguidos"] começou sobre forte pressão policial [...]».
TVI, Jornal da Uma, 16 de novembro, 14h02.

O que ali se queria dizer era «sob», ou seja «debaixo de» uma forte pressão policial, e não «sobre». As preposições «sob» e «sobre» são antónimas: «sobre» reporta-se com frequência a uma posição de superioridade relativamente a algo («por cima de») e «sob» a uma posição de inferioridade («por baixo de»). «Sob» provém da preposição latina «sub», «sobre» provém da preposição latina «super». «Sub-» como prefixo ou elemento de composição surge em palavras como: subaquático, subterrâneo, subsolo, subalterno, subjugar, submeter, submergir; e «sobre-» em palavras como sobreloja, sobrecapa, sobreabundância, sobrenatural ou sobretaxa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

31. Francófona ou Francesa


«Rui Neumann é jornalista em França, e em Paris, há mais de 20 anos, e acompanha estes temas de segurança francófona».
SIC, Jornal da Noite, 16 de novembro de 2015, 21h11.

Às vezes quer-se adornar o discurso e erra-se. Apesar da sobreposição, o que a jornalista, autora da reportagem sobre os atentados terroristas em França, queria dizer era «segurança francesa», ou seja, a segurança em França, dos naturais, habitantes ou cidadãos de França, e não a «segurança francófona», ou seja, a segurança daqueles que falam francês ou que o têm como língua oficial ou dominante.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

30. Cheque mate ou Xeque-mate


«[António Costa] Deu a provar a Cavaco o seu próprio veneno, atropelou a coligação de direita, fez orelhas moucas à moral e aos bons costumes, mandou eleger Ferro Rodrigues contra as convenções e prepara-se para um cheque mate - mesmo que Cavaco não lhe dê posse sairá sempre com mais do que na noite em que todos o davam como derrotado».
Luís Osório - Opinião «Costa não é um ‘bonzinho’», Sol, 13 de novembro de 2015.

«Cheque mate» não existe. O que existe é «xeque-mate», expressão utilizada no xadrez para designar a jogada final de ataque ao rei, em que este fica sem possibilidade de fuga ou defesa. «Cheque» é uma ordem bancária de pagamento ou um vale que confere um determinado desconto. A confusão advém provavelmente da homofonia, já que «cheque» e «xeque» se pronunciam do mesmo modo, mas têm significados e grafias diferentes.

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

29. Solarengo ou Soalheiro (2)


«O mês de novembro tem batido recordes de temperaturas altas para esta altura do ano. Um pouco por toda a Europa os dias têm sido amenos e solarengos
Metro, 16 de novembro de 2015, p. 12.

Que este é um erro recorrente aqui se comprova, com poucos dias de intervalo. Já o havíamos referido, mas vamos sublinhá-lo, uma vez mais, «solarengo» significa «relativo ou pertencente a um solar», isto é, a uma casa nobre. O que ali se queria dizer era «soalheiro», ou seja, «iluminado pelo sol». A etimologia explica, «solarengo» provém de «solar + -engo», «soalheiro» provém de «soalhar + -eiro». Não tem razão o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa que as dá como sinónimas.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

28. Solarengo ou Soalheiro (1)


«Não se soubesse que lá dentro [Parlamento] decorria uma tensa discussão sobre o futuro do país e poderia dizer-se que, para alguns, esta escadaria é o local ideal para passar uma tarde solarenga e relaxada».
Diário da Manhã, TVI, 10 de novembro de 2015, 8h28.

«Solarengo» significa «relativo ou pertencente a um solar», isto é, a uma casa nobre. O que ali se queria dizer era «soalheiro», ou seja, «iluminado pelo sol». A etimologia explica, «solarengo» provém de «solar + -engo», «soalheiro» provém de «soalhar + -eiro». Não tem razão o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa que as dá como sinónimas.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

27. Desfolhar ou Folhear

«Nós ainda hoje no Parlamento assistimos a um desfolhar de jornais [...]».
Diogo Feio (em frente-a-frente com João Galamba), Jornal das 9, SIC Notícias, 9 de novembro de 2015, 21h32.

Obviamente que neste caso não é «desfolhar» jornais mas sim «folhear» jornais. «Desfolhar» significa «tirar as folhas, as pétalas», «folhear» é «virar as folhas de um livro, jornal, revista ou folheto». A ocorrer, por absurdo, desfolhar um jornal equivaleria a «arrancar-lhe» as folhas.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

26. Baco ou Báculo



«D. José Carvalho já é bispo de Setúbal.
O novo bispo de Setúbal recebeu o anel, a coroa e o baco durante a homilia».

É quase incompreensível como um erro destes ocorre. O bispo de Setúbal recebeu o «báculo», não o «baco». «Báculo» é o bordão usado em cerimónias litúrgicas pelos bispos; «baco» é - diz-me o Priberam - um caixão para lavagem de diamantes. Báculo, em sentido lato, é o cajado usado pelos pastores que serve de apoio e de ajuda à condução do gado. Tem amiúde uma extremidade curva para puxar a rês para junto de rebanho e uma extremidade bicuda que serve para atacar e ferir o lobo. Em sentido restrito, refere-se ao báculo episcopal que simboliza o papel de «pastor» do «rebanho» divino (fiéis). É possível que a confusão aqui seja entre «báculo» e o antropónimo «Baco», o deus romano do vinho.

terça-feira, 3 de novembro de 2015

25. Juíz ou Juiz


«Caso Ricardo Salgado não apresente o dinheiro ou bens nesse valor, o juíz Carlos Alexandre “pode reduzir o montante que foi determinado ou propor outras medidas de coacção”».

«Juiz» é uma palavra aguda, ou seja, com acento tónico na última sílaba. Segundo as regras de acentuação, as palavras agudas não levam acento gráfico no i tónico, quando este não forma ditongo com o u anterior e está seguido de z em fim de sílaba, como acontece por exemplo em «raiz». Assim, a palavra «juiz» não leva acento na vogal i. É possível que a confusão advenha do feminino, «juíza», e dos respetivos plurais, «juízes» e «juízas».

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

24. Ao molhe ou Ao molho


«Cuidado com eles. Sinais vermelhos? Mentira, não existem. E o respeito a conduzir? Também não. É tudo ao molhe. Taxistas, motos, autocarros, carros...»
Marco Silva, Expresso, Primeiro Caderno, de 24 de outubro de 2015, p. 38.

A expressão «ao molho» significa em grande número, em grande quantidade, de maneira confusa e pouco planeada. Tem ainda outras equivalentes de cunho popular: «à molhada», «tudo ao molho», «todos ao molho», «tudo ao molho e fé em Deus». É possível que se trate de uma redução da expressão «aos molhos». Ao passo que «molhe» é o paredão que avança pelo mar dentro, à entrada de um porto, e que permite quebrar o ímpeto das ondas e servir de abrigo aos navios. O que ali se queria dizer era obviamente «ao molho» e não «ao molhe». Terá sido porventura um problema de transcrição motivado pela paronímia, ou seja, palavras com diferente significado, mas semelhantes na escrita e na pronúncia.

sábado, 31 de outubro de 2015

23. Ciclo vicioso ou Círculo vicioso



O conflito atrai o conflito e isso torna-se um ciclo vicioso, nunca mais acaba. 
José Manuel Capristano, Record, 28 de outubro de 2015.

A expressão correta é «círculo vicioso» e não «ciclo vicioso». «Círculo vicioso» é a expressão usada para designar uma sucessão de factos que se repetem sem cessar e em que se volta sempre ao ponto de partida. A ideia de círculo é, aliás, suficientemente expressiva para intuir o seu sentido, sendo também usada em expressões com idêntico valor, tais como «raciocínio circular», por exemplo.
A expressão «ciclo vicioso» poderá ser uma corruptela de «circulo vicioso», quer pela semelhança fonética entre «círculo» e «ciclo», quer pela tendência lusa de enfraquecer ou mesmo não pronunciar as vogais átonas pós-tónicas de palavras esdrúxulas. Não raramente «círculo», dito apressadamente, soa como «ciclo». Acresce que a representação dos ciclos tende a ser efetuada através de esquemas circulares. Aliás, o elemento de composição «ciclo-», do grego kúklos, -ou, roda, exprime, também ele, a noção de círculo, como por exemplo em «hemiciclo».

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

22. Vão haver ou Vai haver



«Tenho a certeza absoluta que vão haver ainda equipas a perder muitos pontos».
Declarações de Rui Vitória após o Benfica-Sporting, RTP 1, 26 de outubro de 2015.

No domingo o dia correu manifestamente mal a Rui Vitória. Como se não bastasse o resultado do jogo também escorregou na conferência de imprensa. Não pode dizer «vão haver» equipas mas sim «vai haver» equipas. O verbo haver, no sentido de «acontecer ou existir», é impessoal, pelo que se conjuga sempre na terceira pessoa do singular. Neste caso, como é usado com um verbo auxiliar («ir»), é este que tem de ser colocado no singular, concordando assim com o verbo principal («haver»).

terça-feira, 27 de outubro de 2015

21. Recaiem ou Recaem



«José Sócrates [..] esgrimiu, numa sala com um público semelhante à de qualquer programa da manhã das estações de televisão generalistas, um ataque cego à Justiça e aos jornalistas sem dizer uma única palavra sobre os fortes indícios de corrupção, entre outros, que sobre ele recaiem [...]».
Felícia Cabrita, Sol, 24 de outubro de 2015.

A terceira pessoa do plural do presente do indicativo do verbo «recair» é «recaem» e não «recaiem». Na melhor das hipóteses, «recaiem» poderia ser a terceira pessoa do plural do presente do conjuntivo ou do imperativo de um putativo verbo «recaiar», ou seja, «tornar a caiar».

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

20. Se tratam ou Se trata


«Claro que se tratam apenas de valores indicativos com base nas estimativas do PS [...]»
Expresso, Primeiro Caderno, de 24 de outubro de 2015, p. 5.

O verbo «tratar» sempre que acompanhado da preposição «de» é impessoal, pelo que não se flexiona no plural. No caso vertente não tem de concordar com «valores». A frase correta teria, pois, de ser: «Claro que se trata apenas de valores indicativos com base nas estimativas do PS [...]».

sábado, 24 de outubro de 2015

19. Inviezamento ou Enviezamento



«A coligação PSD/CDS foi a clara vencedora das eleições, mostrando que o divórcio violento entre o país e o governo ao longo de quatro duríssimos anos foi mais um inviezamento zarolho dos media do que uma realidade de facto».
Paulo Ferreira - 112 palavras a mais. Observador, 23 de outubro de 2015.

A palavra certa é «enviesamento», com «e» inicial e depois com «s», e não «inviezamento». A grafia é explicada pela etimologia da palavra: enviesar + -mento, sendo que «enviesar» provém de en- +  viés + -ar. Ou seja, a palavra tem o prefixo «en», iniciado por «e», e o elemento de composição «viés», terminado em «s». E não «i» e «z». Dois erros, pois, numa palavra só...

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

18. Desciplicente ou Displicente


«António Costa acusa Pedro passos Coelho, ou seja, a Coligação de ser desciplicente [...]»

É muito provável que aquele «desciplicente» possa ter sido uma dislexia, uma confusão momentânea de soletração. Ainda que me admire de, logo depois de dito, não ter sido detetado e corrigido. Seja como não é «desciplicente» mas sim «displicente», ou seja, a qualidade daquele que não se empenha ou que demonstra falta de zelo ou interesse.

sábado, 17 de outubro de 2015

17. Mais bem ou Melhor

«Os podologistas têm obrigação de estar melhor preparados [...]».

Aqui seria mais correto dizer «mais bem preparado» e não «melhor preparado». «Melhor» é comparativo de «bom»; «mais bem» é comparativo de «bem». Em «bem preparado», o advérbio (bem) faz «corpo» com o particípio passado (preparado). Há mesmo casos em que o advérbio «bem» e o particípio passado se chegam a unir graficamente, através de hífen, como acontece com: bem-fadado, bem-falado, bem-feito, bem-parecido, etc. 

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

16. Amadoreceu ou Amadureceu


Acerca do jogador André Carrillo: «Melhorou e amadoreceu».
A Bola, 13 de outubro de 2015.

O jogador do Sporting «amadureceu», não «amadoreceu». Etimologicamente, «amadurecer» provém de: «a- + maduro + -ecer». Foneticamente, aquele «u» pronuncia-se. O erro só pode advir da confusão gráfica com palavras como «amador» ou ser uma gralha.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

15. Do ou De o (2)


«A hipótese de largar o poder incomoda a Direita, a probabilidade do Bloco ou do PCP participarem numa solução aterroriza-os» 
Mariana Mortágua - «Adeus, Passos», Jornal de Notícias, de 13 de outubro de 2015).

Eis mais uma contração indevida do artigo «o» com a preposição «de», resultando em «do». Também aqui a preposição se relaciona com o verbo e não com o substantivo e introduz uma construção com infinitivo (participar), porém flexionado (participarem), sendo o que a distingue da anterior. A contração ali não pode ocorrer. 
Quase que poderia jurar que não há vez que «pegue» - ainda que virtualmente - num jornal que não detete este erro...

terça-feira, 13 de outubro de 2015

14. Do ou De o (1)


«A vez do Rui brillhar»
Record12 de outubro de 2015a propósito do jogo Sérvia-Portugal.

Nesta frase a contração do artigo «o» com a preposição «de», resultando em«do», não é correta. Teria de ser «A vez de o Rui brilhar» e não «A vez do Rui brilhar». 
Aquela preposição relaciona-se com o verbo e não com o substantivo e introduz uma construção com infinitivo (brilhar), pelo que a contração não pode ocorrer.
É infelizmente um erro muitíssimo comum e que aqui tem honras de título, em letras garrafais, sendo, como tal, (ainda) menos desculpável. 

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

13. Estremo ou Extremo


«Os peruanos já tinham perdoado o comportamento do estremo e as suas noitadas mas agora tudo pode mudar de figura».
Sapo Desporto, 11 de outubro de 2015.

Pode-se perdoar o comportamento do «extremo» do Sporting e da seleção do Peru, mas é quase imperdoável que se confunda «extremo» com «estremo». Extremo é um jogador que joga pelas faixas, pelas zonas laterais do campo. Estremo é a primeira pessoa do indicativo do verbo «estremar» que significa «delimitar», «demarcar», «balizar», sobretudo terrenos.
A confusão advém provavelmente da homofonia, já que «estremo» e «extremo» se pronunciam do mesmo modo, mas têm significados e escritas diferentes.

domingo, 11 de outubro de 2015

12. Disfrute ou Desfrute




«Colecione os 3 DVD e disfrute de conteúdos extra»
Anúncio de página inteira à coleção de DVD da série televisiva Downton Abbey, Expresso, Primeiro Caderno, 10 de outubro de 2015, p. 33.

É um erro comum este «disfrute». Deveria ser «desfrute». Etimologicamente: «desfrute» provém de «des-» + «fruto» + «-ar». É possivel que a corruptela advenha da pronúncia (dis-). Desfrutar é ali sinónimo de usufruir ou retirar benefício.

P.S. - Vale a pena referir, por honestidade intelectual, que o Dicionário dito de Morais refera também «disfrutar» como: «o m.q. desfrutar»... O que não é suficiente para o chancelar do ponto de vista da norma culta.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

11. Apresentamos ou Apresentámos


«[...] fisicamente não nos apresentamos nas melhores condições [...], mas penso que iniciamos bem a segunda [...]; apareceu [sic] esses dois golos [...] que acusamos; acusamos claramente esses dois golos [...]»
Sá Pinto em conferência de imprensa depois do FC Porto-Belenenses, TVI 24, Diário da manhã, 5 de outubro de 2015, 9h49.

Referindo-se a um facto passado, a uma ação inteiramente concluída, como é o caso, a forma flexionada dos verbos «apresentar», «iniciar» e «acusar» não deveria ser o presente do indicativo - «apresentamos», «iniciamos» e «acusamos» - mas sim o pretérito perfeito - «apresentámos», «iniciámos», «acusámos». 
Esta errónea presentificação do passado é um fenómeno recente e está cada vez mais presente no discurso mediático.  

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

10. Ter a haver ou Ter a ver


«[...] a tranquilidade tem a haver também com [...]»
Sérgio Conceição em conferência de imprensa depois do Sporting-Vitória de Guimarães, TVI 24, Diário da manhã, 5 de outubro de 2015, 9h45.

Este é um erro recorrente. «Tem a haver» é «tem a receber», pelo que na frase acima teria de ser «tem a ver», ou seja, «tem relação com; diz respeito a». Ou, em alternativa, «tem que ver».
Na verdade, por simplificação ou para eliminar alguma aliteração derivada do uso do «que», temos tendido a suprimi-lo do discurso, nalguns casos gerando confusão. «Ter que ver» foi sendo preterido em favor de «ter a ver», um galicismo que, com laivos de hipercorreção, se tornou forma preferencial.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

9. Dantesco por Gigantesco


«É certo que este Chelsea não se recomenda, tendo ontem sofrido a quinta derrota em onze encontros oficiais na época mas sempre tem um naipe de estrelas que torna dantesca a tarefa de os bater. 
E dantesco foi o FC Porto».
Metro, 30 de setembro de 2015.

A tarefa de derrotar o Chelsea não foi dantesca, nem o FC Porto ontem foi dantesco. Tarefa e clube poderão ter sido gigantescos ou gigantes; colossais ou imensos. Dantescos, nunca! Dantesco é horroroso, pavoroso, horrível, diabólico, medonho. Custa-me a aceitar como num jornal se podem utilizar palavras com tamanho desconhecimento do seu sentido.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

8. Vernáculo = Palavrão


«Quando pergunto à cofundadora da associação britânica Women in Football (Mulheres no Futebol) se sabe português, ela diz que não. Mas rapidamente reconsidera. "Well... filha da puta?" Diz-se que o vernáculo é das primeiras coisas que se aprende numa língua estrangeira [...]»
Expresso, Primeiro Caderno, 26 de setembro de 2015, p. 39.

Já tinha constatado esta evolução semântica, mas porventura nunca de forma tão clara. Aqui vernáculo é igual a palavrão. 
A palavra vernáculo é utilizada para designar o que é nacional, próprio de um país, e, no caso da língua, o idioma no seu estado mais puro, sem estrangeirismos. 
Quando a aprendi era usada para se referir ao idioma nacional, em casos como: «antes do Vaticano II, a missa era rezada em latim, depois passou a vernáculo». Mas era sobretudo utilizada para se referir à linguagem tida como antiquada, caída em desuso, em casos como: «o autor X utiliza demasiado vernáculo». Nesta aceção, tinha uma conotação pejorativa, e era quase equivalente a «castiço» ou até mesmo «possidónio».  
Depois evoluiu para se referir a expressões coloquiais e/ou calão. E agora parece também ser igual a palavrão, como o prova à saciedade a citação acima.

sábado, 26 de setembro de 2015

7. Irá se ou Ir-se-á


«Bom, tive um convite da concorrência para voltar às novelas que provavelmente irá se consumar lá para o final do ano»
Diogo Infante, Grande Entrevista, RTP  Informação, 23 de setembro de 2015, 51m40.

As nódoas caem em todos os panos e na oralidade ainda mais. Foi o que aconteceu com este «irá se». Se a frase fosse negativa - «não se irá consumar»; interrogativa - «onde se irá consumar?»; ou exclamativa - «não sei quando se irá consumar!», estaria perfeito. Sendo afirmativa, não está. Para o caso teríamos duas alternativas: «ir-se-á consumar» - num registo mais cuidado - ou «irá consumar-se» - num registo mais informal. «Irá se consumar» é que não!

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

6. «Stores» em vez de lojas


«Disponível nas stores para iOS e Android [...]»
Folheto de divulgação do Euroticket, distribuído com o jornal Metro de 24 de setembro de 2015.

Não convivo mal com estrangeirismos, em casos de ausência de alternativa ou de alternativa débil em vernáculo. Ou até mesmo por fluidez. Há casos que por estarem tão generalizados, a tradução forçada representa um tropeção quando se lê. Às tantas por purismo ou defesa da língua cai-se num certo possidonismo. Mas há outros?!... Veja-se este? Que diabo, porque não «lojas» ou «lojas online» - concedo até - em vez de «stores»?!... E ademais «stores» sem itálico, como se a palavra já estivesse consagrada na Língua Portuguesa... Passaria incólume com uma destas formulações: «Disponível para iOS e Android nas respetivas App Stores» ou «Disponível nas App Stores para iOS e Android»... Assim, não...

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

5. Salamizar




«E aponta o dedo aos responsáveis: o governo, que desmembrou a CP e a retalhou às peças. Ou melhor, “decidiu salamizá-la”. Cortou-a em fatias? É isso. A companhia ficou em tiras. Jerónimo, mais uma vez, ganhou na arte do improviso».
Jerónimo de Sousa, cit. pelo Expresso online, de 22 de setembro de 2015.

Salamizar v. (2015) Cortar às fatias. Etim. - De salame.

Está bem formada, a partir de «salam-» + «-izar». É expressiva e compreensível. O que se pode exigir mais?

P.S. - Ainda que não ao verbo, encontram-se referências anteriores ao substantivo «salamização», a mais antiga de 1978como uma simples pesquisa no Google facilmente demonstra. Registe-se que nesta notícia o Expresso foi sensível à palavra referindo em título «
Um novo verbo: “salamizar”», e depois em destaque: «Jerónimo esteve no Entroncamento, na sua primeira arruada. Foi curta e breve. No final, falou diretamente ao coração dos ferroviários e criou para eles um neologismo. Diz que o Governo está a “salamizar a CP”».

terça-feira, 22 de setembro de 2015

4. Alpinista social vs Elevador social

Um dia destes num daqueles programas da manhã na televisão surpreendi o uso da expressão «alpinista social». É uma expressão de valor negativo que pretende significar alguém que ascendeu socialmente não por mérito próprio, mas à sombra de outros. Não deixei de meditar na contradição entre a expressão «alpinista social» e o valor referencial da palavra «alpinista», isto é, alguém que atinge o topo das montanhas firmado no seu próprio esforço. 
Por associação de ideias, lembrei-me da expressão «elevador social», usada comummente em análises sociológicas, com valor positivo, para significar um indivíduo ou grupo que, mercê do seu esforço, consegue ascender socialmente. 
Em suma, e referencialmente, o «alpinista» sobe com o esforço próprio; quem sobe através do «elevador» fá-lo com o esforço da máquina. 
Não deixei de tirar a bissetriz: seria porventura mais lógico, atento o valor referencial dos substantivos «alpinista» e «elevador», a que depois se juntou o adjetivo «social», que «alpinista social» fosse a expressão de valor positivo e «elevador social» fosse a expressão de valor negativo. Mas não é. 
Assim é o curso das palavras...

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

3. Balneário ou Vestiário. Relvado ou Gramado

«É verdade, fiquei com muitas palavras daí, foram seis anos. Aqui com os brasileiros às vezes digo "vou para o balneário", e aí eles "qual balneário?" [risos]. Ou então digo relvado em vez de gramado. Manias de Portugal».
Expresso, Primeiro Caderno, 19 de setembro de 2015, p. 38.

Eis um excerto de uma entrevista ao antigo jogador do Benfica, Lima, que mostra bem as diferenças vocabulares entre o português de Portugal e do Brasil, aqui numa área específica, o futebol. Por lá, como sublinha Lima, balneário é vestiário e relvado é gramado. Além de equipa ser time, adepto ser torcedor, taça ser copa, e tantas outras.

domingo, 20 de setembro de 2015

2. A moral ou O moral

«O Benfica vai ao Dragão com a moral em alta»
RTP 1, Bom dia, Portugal, 20 de setembro de 2015, 8h40.

Este erro é já um clássico tal a frequência com que ocorre. É muito comum ouvir-se expressões como «levantar a moral», «a moral das tropas», e afins. Nesta aceção, como na da frase acima, teria de ser «o moral» - substantivo masculino - que significa «estado de espírito, ânimo» - e não «a moral» - ou seja, os princípios e os valores que regem a conduta do homem».

Moral da história: atenção ao género do substantivo sempre que falamos de moral...

sábado, 19 de setembro de 2015

1. Estrear pela primeira vez

«Hoje a equipa do Astana estreia-se pela primeira vez na Liga dos Campeões»
TSF, Jornal de Desporto, 15 de setembro de 2015, 8h30.

A frase pareceu-me ter sido previamente escrita e depois lida. Mas quem a leu apercebeu-se e corrigiu «na passada», referindo, e cito de memória: «claro que se se estreia, é pela primeira vez»... Obviamente...
Na mesma linha de «entrar para dentro» ou «sair para fora», «subir para cima» ou «descer para baixo», e tantos outros, este é mais um pleonasmo vicioso, sempre de evitar...