segunda-feira, 21 de novembro de 2016

89. Reune ou Reúne


«Quando misteriosas naves espaciais aterram em vários pontos do globo, uma equipa de elite – liderada pela especialista em linguística Louise Banks (Amy Adams) – reune-se para investigar». 
Sinopse do filme O primeiro encontro, site da NOS, 20 de novembro de 2016.

Há coisas do demo, de facto!… Quis o acaso que o erro na sinopse do filme O primeiro encontro, disponível no site da NOS, surgisse justamente num trecho em que se fala de uma especialista em linguística… O erro é no tempo verbal do verbo reunir já que «reúne» é uma palavra acentuada, dado que existe um hiato entre o «e» o «u», sendo o «u» a vogal tónica.

P.S. – Na mesma sinopse, também há uma gralha a falta do l final em «mundia», que devia ser «mundial».

domingo, 20 de novembro de 2016

88. Bem vindo ou Bem-vindo

Foto: Paulo J. S. Barata (19 de novembro de 2016)

À entrada do Parque das Nações, a respetiva junta de freguesia saúda-nos com um «Bem vindo». É comum a confusão entre «Benvindo» (nome próprio) – até mais usual no feminino: «Benvinda» – e «bem-vindo», fórmula de saudação. Mas é porventura menos comum o lapso entre «bem vindo» e «bem-vindo». «Bem-vindo» é uma palavra composta, formada por justaposição do advérbio «bem» e do adjetivo verbal «vindo» que têm de ser ligados por hífen.

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

87. Solarengo ou Soalheiro (3)

«[...] o fim de semana prolongado e solarengo acabou por presentear os que escolheram o Sul»
Diário da Manhã, TVI, 31 de outubro de 2016, 8h09.

Solarengo significa «relativo ou pertencente a um solar», isto é, a uma casa nobre. O que ali se deveria ter dito era «soalheiro», ou seja, «iluminado pelo sol». Etimologicamente não há dúvidas, «solarengo» provém de «solar + -engo», «soalheiro» provém de «soalhar + -eiro». 

P.S. - Registe-se, porém, que o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa já apresenta - mal - ambas as expressões como sinónimas.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

86. Mais valia ou Mais-valia


A propósito de Jonas: «[...] vale de facto o seu peso em ouro e representa uma mais valia tremenda para os encarnados»
«Em torno do desperdício, no futebol...», Cartas na mesa, A Bola, 24 de outubro de 2016.

Mais valia é uma expressão composta de onde se deve grafar «mais-valia». Significa benefício, vantagem, trunfo. Ou seja, a presença de Jonas na equipa representa um benefício, uma vantagem, um trunfo para o Benfica. Para além do sentido comum é muito usada em economia e finanças para representar o lucro, o excedente das receitas sobre as despesas. 
A expressão pode ser usada sem hífen, por exemplo na frase: mais valia o articulista ter consultado um dicionário antes de usar a palavra...

terça-feira, 11 de outubro de 2016

85. Exceto ou Exeto

Foto: Paulo J. S. Barata (29 set. 2016)

No Campo Grande, mesmo em frente à Biblioteca Nacional de Portugal, pelo facto de parte do passeio estar escalavrado e não ter continuidade, a empresa que procede às obras colocou esta indicação direcionando os transeuntes para o separador central, «exeto» [sic] quem vai para a Biblioteca... Como é fácil de ver, o que teria de lá estar era «exceto» - com cê - e não «exeto», porque aquele cê é pronunciado... A única letra suprimida com a nova grafia foi o pê («excepto») que não é pronunciado... Está tudo devidamente explicado na Base IV - «Das sequências consonânticas», do Acordo Ortográfico de 1990.

domingo, 25 de setembro de 2016

84. Titulo ou Título


«[...] e depois do ultimo titulo [...]»
Eduardo Barroso  - «A nossa terceira derrota de era Jesus». A Bola, 21 de setembro de 2016, p. 36.

É óbvio que a falta do acento em «titulo» se trata de uma gralha. Mas que em certos contextos pode ser danosa. É que «titulo» é uma forma do verbo «titular», ou seja, dar título a alguém. E «título» é, neste contexto, uma distinção, no caso o troféu da Primeira Liga de Futebol.

P.S. - Assinale-se também, neste caso, o pecadilho de «ultimo» em vez de «último».

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

83. Ultimo ou Último


«[...] e depois do ultimo titulo [...]»
Eduardo Barroso  - «A nossa terceira derrota de era Jesus». A Bola, 21 de setembro de 2016, p. 36.

É óbvio que a falta do acento em «ultimo» se trata de uma gralha. Mas que em certos contextos pode ser danosa. É que «ultimo» é uma forma do verbo «ultimar», ou seja, concluir, terminar algo. E «último» é, consoante as circunstâncias, um adjetivo ou um substantivo, significando o derradeiro, o final, o que vem no fim, o pior, ou ainda o mais recente, o mais novo, o de menor categoria.

P.S. - Assinale-se também, neste caso, o pecadilho de «titulo» em vez de «título».

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

82. Há ou À

 

«Estamos agora, há quinta jornada, em segundo lugar a um ponto do primeiro [...]»
Eduardo Barroso  - «A nossa terceira derrota de era Jesus». A Bola, 21 de setembro de 2016, p. 36.

Em «à quinta jornada», como em «até ao momento», «até à data» ou «até à tarde de ontem», e frases similares, usa-se «à», ou seja, a contração da preposição «a» com o artigo definido «a». «Há» é uma forma do verbo haver, com o sentido de «existir», usada comummente em expressões de tempo, como, por exemplo, em: «até há três anos, mas mais há ano e meio [...]», expressões que o mesmo cronista usa mais abaixo no mesmo texto*.


Curiosamente, e com a mesma proveniência, já aqui assinalámos igual erro, o que já pode configurar um padrão.

* Assinalem-se também, neste caso, os pecadilhos de «ultimo» em vez de «último» e de «titulo» em vez de «título».

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

81. Excepto ou Exceto

Foto: Paulo J. S. Barata (6 de setembro de 2016)

A mesma autarquia - Câmara Municipal de Tavira -, duas grafias... «Excepto», na grafia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, «exceto», na grafia atual, em Portugal... Calculo que os sinais que mantêm a grafia antiga já existissem, mas custava assim tanto mandar pintar aquela palavra novamente de modo a que na mesma cidade, e pior, no mesmo gradeamento, não coexistissem duas grafias?

terça-feira, 30 de agosto de 2016

80. Sob ou Sobre (4)


«[...] foi visível o desânimo do atleta [...] que, aos 27 anos, vê na possibilidade de representar o campeão de Inglaterra uma hipótese dourada para a sua carreira sobre todos os níveis».
O Jogo, 30 de agosto de 2016, p. 6.

Este é um erro recorrente. O que ali deveria estar era «sob», significando «debaixo de», por existir uma relação de subordinação dos níveis à carreira. Tal como acontece com as expressões «sob todos os pontos de vista» ou «sob todos os aspetos».
As preposições «sob» e «sobre» são antónimas: «sobre» reporta-se com frequência a uma posição de superioridade relativamente a algo («por cima de») e «sob» a uma posição de inferioridade ou subordinação («por baixo de»). 

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

79. Houveram ou Houve


Um antigo atleta olímpico, referindo-se aos Jogos de 2016:
«Mas também deixe-me realçar que houveram atletas em 4.º lugar, atletas em 5.º lugar, em 6.º [...]»
Opinião Pública, SIC Notícias, 22 de agosto de 2016, 11h16.

Houve atletas e não houveram atletas. O verbo haver, com sentido de existir, é um verbo impessoal e conjugado apenas na 3.ª pessoa do singular (houve), independentemente de o sujeito (atletas) ser plural.
A forma houveram, caída em desuso, é possível apenas quando o verbo haver se apresenta com o sentido de ter: «E no final, sob forte aplauso do público, os cantores houveram de bisar». 

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

78. Quaisqueres ou Quaisquer


Sobre um crime de violação de menor na Madeira, diz-se:
«há sensivelmente dois anos, ao Carlos foi entregue uma casa com todo o conforto, já que vivia numa espécie de casebre sem quaisqueres condições [...]».
Notícias 24, TVI 24, 21 de agosto de 2016, 10h12.

Na língua portuguesa, a regra de formação do plural manda acrescentar um -s final à palavra no singular, no caso dos substantivos terminados em vogal, ou -es no caso dos substantivos terminados em -r.  Porém, o caso dos pronomes ou determinantes indefinidos «qualquer/quaisquer» constitui uma exceção a esta regra, pelo que «quaisqueres», como na frase acima, está errado. 
«Qualquer» e «quaisquer» são palavras formadas por justaposição, ou seja, que resultam da união de duas palavras formando uma: qual + quer, originando «qualquer», ou quais + quer, originando «quaisquer», sem que se registe qualquer alteração. Porém, e se se reparar bem, em «quaisquer», há já a flexão em número, de qual para quais, mas no primeiro elemento e não no segundo, como é normal.

domingo, 7 de agosto de 2016

77. Saíu e Saiu


«Tenho apenas uma irmã, a Paula, um pouco mais velha que eu. Apesar de vivermos há quase 40 anos a 300 km um do outro – a minha irmã não saíu de Lisboa [...]»
Entrevista a João Semedo, Público, 7 de agosto de 2016. 

A terceira pessoa do singular do pretérito perfeito do verbo sair é «saiu» e não «saíu». Admito que a confusão seja com a terceira pessoa do singular do pretérito imperfeito que é «saía» e não «saia» (primeira pessoa do singular do presente do conjuntivo).

quinta-feira, 14 de julho de 2016

76. Malicioso ou Maléfico


A sinopse do filme «The Conjuring 2 - A Evocação» reza assim:
«O novo thriller sobrenatural [...] traz uma nova história verídica saída dos arquivos dos reconhecidos Ed e Lorraine Warren, o casal especialista em casos paranormais.  [...] interpretam o casal Lorraine e Ed Warren que, numa das suas investigações mais aterradoras, viaja até ao norte de Londres para ajudar uma mãe solteira a criar quatro crianças numa casa assombrada por espíritos maliciosos». 
Site da NOS, 10 de julho de 2016.

A questão aqui são os espíritos maliciosos. Trata-se de uma tradução demasiado literal, e sem atender ao contexto, do inglês «malicious spirits». Seria mais adequado usar «maléficos», «malignos», «diabólicos» ou equivalente. É bem certo que a «malícia» - e a etimologia comprova-o - é definida pelos dicionários como tendência, inclinação, aptidão para o mal, mas não é menos certo que o seu uso consagrado é o de «segundo sentido» - ou mais referencialmente de «mau sentido» - do dito picante, do chiste, da provocação. Este mal é aqui o pecado, referenciado à moral judaico-cristã, e não tanto o mal como oposto de bem.

quinta-feira, 7 de julho de 2016

75. Beneficiência e Beneficência


«Jogo de beneficiência em Odivelas», titulava o Diário de Notícias, a propósito de um jogo de angariação de fundoa para o antigo guarda-redes do Sporting, e que representou Portugal nos Jogos Olímpicos de Atlanta.

A forma correta da palavra é beneficência. Beneficiência não existe. Beneficência é a disposição para fazer o bem, praticar caridade e ajudar os outros. É sinónimo de benevolência, de filantropia, de bondade, de caridade, de ajuda. Trata-se de um erro frequente advindo da confusão com a palavra «ciência» ou eventualmente de «simpatia» com «benefício», já que beneficência é o «ato de fazer benefícios». O dicionário da Academia das Ciências de Lisboa apresenta mesmo como sinónimo de benefício a expressão «espectáculo de beneficência». Bastaria, porém, um breve segundo de reflexão etimológica para se perceber da impossibilidade daquela palavra que provém do latim beneficentĭa. A quarta sílaba é, assim, «cênc» e não «ciên». O mesmo se passa com a palavra beneficente, cognata de «beneficência», que é escrita «cen» e não «cien».

sábado, 2 de julho de 2016

74. Fobia e Mania


Ao longo das marcações dos penáltis no jogo Portugal-Polónia, do dia 30 de junho, no Euro 2016:
«O canal de televisão espanhol Cuatro seguiu com uma câmara Cristiano Ronaldo ou não fossem eles ter essa fobia com o capitão português [...]».
Mais futebol, TVI24, 1 de julho de 2016, 23h08.

O que a jornalista queria dizer era a «mania», a obsessão, das televisões  espanholas com os comportamentos do capitão da seleção nacional e não a «fobia», ou seja, o medo exagerado, o pavor, do mesmo. A confusão entre fobia e mania é recorrente e agravada pelo facto de, como se percebe, os termos serem antónimos.

quinta-feira, 30 de junho de 2016

73. Fatos e Factos


Bruno de Carvalho, acerca do jogador André Carrillo:
«A verdade dos fatos é que estava tudo acordado para a negociação do contrato, e de repente o jogador voltou atrás na palavra».
Expresso - Revista, 25 de junho de 2016, p. 33.

Em Portugal, na palavra «factos», o cê é claramente pronunciado, razão pela qual deve ser grafado. É portanto «facto» e não «fato». Ademais, situação é até expressamente prevista na Base IV do Acordo Ortográfico:
«c) Conservam-se ou eliminam-se facultativamente, quando se proferem numa pronúncia culta, quer geral, quer restritamente, ou então quando oscilam entre a prolação e o emudecimento: aspecto e aspeto, cacto e cato, caracteres e carateres, dicção e dição; facto e fato, sector e setor, ceptro e cetro, concepção e conceção, corrupto e corruto, recepção e receção» (sublinhado nosso). 
O mesmo é dizer, escreve-se «facto» em Portugal e «fato» no Brasil. A situação, portanto, não se altera. 

Admito que a entrevista possa ter sido transcrita por um estagiário, ou similar, mas mesmo assim é fraca desculpa para tal descuido num jornal de referência.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

72. Política estrangeira e Política externa


A propósito do Brexit, tem sido divulgado à saciedade nas redes sociais e nos «media» um excerto de um vídeo da conhecida série britânica, «Sim, Senhor Ministro», no qual, a dado passo, se diz:
«A Inglaterra tem, há 500 anos, a mesma política estrangeira».
«Sim, Senhor Ministro», RTP Memória.

A expressão utilizada por Sir Humphrey Appleby, o sarcástico chefe de gabinete do ministro da Administração Interna inglês, é foreign policy, cuja tradução mais adequada seria «política externa» e não a mais literal «política estrangeira». Ainda que foreign também seja estrangeiro e essa até seja a aceção mais comum. Estaria bem se, por exemplo, se referisse ao Foreign Office, cuja tradução seria, então sim, Ministério dos Negócios Estrangeiros.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

71. Há e À


A propósito do referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia:
«Urnas fecham às 22h00 e não haverá sondagem boca das urnas»
Jornal da Noite, SIC, 23 de junho de 2016.

A coexistência, na mesma frase e com grande proximidade, de dois tempos do verbo «haver» - «haverá» e «há» - poderia fazer soar as campainhas de alarme, mas não fez! Ali, teria de estar evidentemente «à», isto é, a contração da preposição «a» com o artigo definido «a».

segunda-feira, 20 de junho de 2016

70. A moral ou O moral


A propósito da presença da seleção no Euro 2016:
«Naturalmente, a moral está em alta».
RTP3, 18 de junho de 2016, 12h19.

Era inevitável que a propósito da seleção nacional lá viesse novamente «a moral» em alta, em lugar de «o moral» em alta. A frase diz respeito ao moral, ao estado de espírito,  ao ânimo, e não à moral , aos princípios e os valores que regem a conduta do homem.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

69. Provem ou Provém


«O CM sabe que grande parte [dos créditos em risco] provem da gestão de Santos Ferreira».
Correio da Manhã, 17 de junho de 2016, p. 4.

O que ali deveria estar era «provém», a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo «provir», e não «provem», a terceira pessoa do plural do presente do conjuntivo do verbo «provar». A confusão advém por paronímia: «provem» e «provém» são termos semelhantes na forma, mas com significados diferentes. «Prover» é, naquele sentido, advir, resultar, ter origem em, «provar» é fazer prova.

terça-feira, 14 de junho de 2016

68. Cúmulo jurídico acumulado


«[Vale e Azevedo] cumpriu pena ao abrigo de um processo de extradição que o trouxe de Inglaterra para Portugal, num cúmulo jurídico acumulado de 11 anos e meio [...]»

Foi uma intervenção em direto, ou seja, sem preparação, e onde, portanto, o erro pode ocorrer com mais facilidade. Mas, de facto, «cúmulo» já é, por definição, uma acumulação. Não carece pois de lhe juntar o acumulado. Cúmulo [jurídico] acumulado insere-se na categoria dos pleonasmos viciosos, sempre de evitar.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

67. Há e À

«[...] mas medida que os dias passam e que a Alvalade não chega a proposta de 30 milhões de euros [pelo jogador Slimani] [...]»
A Bola, 8 de junho de 2016, p. 18.

Teria de ser «à» («à medida que os dias passam») e não «há» («há medida que os dias passam»), ou seja, ter-se-ia de usar a contração da preposição «a» com o artigo definido «a». «Há» é uma forma do verbo haver, com o sentido de «existir», usada frequentemente em expressões de tempo, como por exemplo em: «há já alguns dias que não chegam propostas a Alvalade». É possível que seja esta a origem da confusão...

quinta-feira, 9 de junho de 2016

66. Vetado ou Votado


«"Eles estão vetados ao fracasso desde que começaram", diz ao Observador Nick Wittney, antigo diretor da Agência Europeia de Defesa e atual investigador sénior do European Council on Foreign Relations.»

O Estado Islâmico está votado ao fracasso, ou seja, está destinado ao fracasso, e não vetado, que significa suspenso, impedido, proibido. Votar e vetar são verbos parónimos, ou seja, com grafia semelhante mas sentido diferente, sendo essa certamente a razão da confusão. 

domingo, 5 de junho de 2016

65. Pião ou Peão


«[Frederico Carvalho] foi assim mais um pião no esquema que estava montado há mais de cinco anos  por compatriotas seus».
Correio da Manhã, 3 de junho de 2016, p 10.

O espião português não foi um «pião» no tal esquema de espionagem que refere a notícia mas sim um «peão». «Pião» é o antigo brinquedo de madeira que se lança com a ajuda de um fio e que gira sobre si próprio ou o movimento inopinado de um automóvel que roda sobre si próprio na sequência de um acidente, «peão» é o soldado de infantaria, um dos mais comuns e menos importantes de um exército, ou ainda uma das peças menores do xadrez. É justamente «peão», e nessa aceção, de peça menor, com pouca importância, de joguete de interesses maiores, que a palavra é utilizada na notícia.
É mais um caso de palavras homófonas, ou seja, com a mesma pronúncia mas grafias diferentes.

sábado, 4 de junho de 2016

64. «Modus vivendi» ou Modo de vida



«O Vítor Baptista [... ] ele tinha esse talento mas tinha também muito de excentricidade que se refletia um pouco até no modus vivendi dele, nas roupas que usava, para a época [...]»
Toni, Documentário Expresso sobre Vítor Baptista, maio 2016, 17m40.

O uso da expressão latina modus vivendi, literalmente «maneira de viver», tem-se vindo a expandir. Começou por ser usado para caracterizar um «modo de vida», uma situação de coexistência entre duas partes desavindas - ex.: «antes de sair o divórcio, estabeleceram em casa o seu «modus vivendi»; ou «após os atentados, israelitas e palestinianos tentam encontrar um modus vivendi». Expandiu-se depois para um «modo de vida» possível que resulta de uma adequação face a uma situação anterior - ex.: após a falência, arranjou um emprego modesto e encontrou o seu modus vivendi; ou «colocado na ilha, o professor criou o seu próprio modus vivendi». Ou mesmo, como é usado na frase acima, para caracterizar um modo de vida peculiar, diferente, que sai da norma...

sábado, 28 de maio de 2016

63. Indiscritível ou Indescritível



«E o que se seguiu não foi melhor do que esta barbárie indiscritível

A barbárie não é «indiscritível» mas sim «indescritível», ou seja, tão horrível que não se pode descrever. A palavra é formada pelo prefixo latino «in-», com o sentido de negação, e pelo adjetivo «descritível», significando algo que se pode descrever, algo suscetível de descrição. É possível que o erro advenha da confusão com palavras de grafia próxima como «indiscrição», mas com outra raiz etimológica. É aliás bastante comum a confusão por paronímia entre «discrição» e «descrição» (1, 2).

quinta-feira, 26 de maio de 2016

62. Trilogia ou Triologia


«José Rodrigues dos Santos assume que o seu novo livro tem afirmações politicamente incorretas. Por isso, talvez não se espante ao ver o que diz o deputado do PCP Miguel Tiago sobre uma teoria que está na triologia de que faz parte o romance que acaba de lançar, o Pavilhão Púrpura».

Tem de ser «trilogia» (tri + lo + gi + a), palavra que provém do grego trilogía, significando um conjunto de três obras literárias, peças musicais, filmes, etc., que se complementam. Embora também exista a palavra «trio» (do italiano trio), igualmente significando um conjunto de três, sendo certamente daí que advém a confusão.

quinta-feira, 19 de maio de 2016

61. A importância da vírgula

«Os poltergeist não existem, só nos filmes».
Umberto Eco - Número zero. Lisboa: Gradiva, 2016, 4.ª ed., p. 11.

Eis como a colocação da vírgula pode influenciar o sentido da frase. Com ela, a frase significa que os poltergeist não existem na realidade, mas apenas nos filmes. Sem ela, a frase significa que os poltergeist existem de facto e não apenas nos filmes. Olho para esta frase e lembro-me sempre da «piada» do oposicionista ao Estado Novo que foi surpreendido pela PIDE a grafitar uma parede com a frase: 

FORA SALAZAR NÃO FAZ FALTA À NAÇÃO. 

Na iminência de ser preso, afirma: 

- Esperem, ainda não acabei. E pontua a frase: 

FORA SALAZAR? NÃO. FAZ FALTA À NAÇÃO.

segunda-feira, 16 de maio de 2016

60. Vírgula entre o sujeito e o verbo


Os  heróis não desistem, insistem!

Mais um dia... Mais desafios!
O despertador tirou-te cedo demais da cama?
O autocarro quis testar as tuas aptidões de velocista?
E os emails, não páram de chegar?

«E os emailsnão páram de chegar?» Assim reza o poema acima de um recente anúncio da Actimel, separando por vírgula o que não deve ser separado, ou seja, o sujeito (emails) do verbo (não páram). Acontece demasiadas vezes...

domingo, 15 de maio de 2016

59. Hostes ou Hostilidades

«Woody abre hostes em La Croisette»

O que ali se quer dizer é «abrir as hostilidades», literalmente, «começar a guerra», metaforicamente, «inaugurar a competição», no caso a edição de 2016 do Festival de Cannes. O «hostes» será, pois, uma redução de «hostilidades» e não - claro está - exército ou multidão. Confesso que nunca tinha visto.

quarta-feira, 4 de maio de 2016

58. Anos luz ou Anos-luz



«[Rui Vitória] está ainda a anos luz do seu colega [Jorge Jesus].»
Eduardo Barroso - «Um campeonato mentiroso». A Bola, 4 de maio de 2016, p. 36.

«Ano-luz» ou «anos-luz» constituem uma única palavra composta por justaposição (anos + luz). O caso ilustra bem a importância da revisão de texto nos jornais. É que o articulista, cujo texto não foi revisto, errou, mas o jornalista, que fez o destaque, grafou-a bem...

terça-feira, 3 de maio de 2016

57. Ansiólitico ou Ansiolítico


«Prescrição de ansióliticos»...»
Jornal da Uma, TVI24, 3 de maio de 2016, 14h02.

É palavra muito em voga hoje em dia, de onde, pela «habituação», a acentuação já não deveria falhar. A sílaba tónica é «lí» e não «o». Teria, pois, de ser grafado «ansiolítico», e não «ansiólitico». Basta, aliás, por analogia, pensar em «lítico», para se intuir da implausibilidade daquele acento.

segunda-feira, 2 de maio de 2016

56. Canasta ou Canastra


«Vendiam peixe com a canasta à cabeça» (vertical 4)
Palavras Cruzadas, Expresso, Revista, n.º 2270, 30 abr. 2016, p. 104.

A palavra era Varinas, mas o que a varina leva à cabeça é a «canastra», ou seja, o cesto, e não a «canasta», isto é, o jogo de cartas.
Para além da confusão, advinda da paronínima, são palavras de grafia próxima mas de sentido diferente, o mais curioso é o erro existir justamente num jogo de palavras...

domingo, 1 de maio de 2016

55. Palissada ou Lapalissada


Fazendo a antevisão do FCP-Sporting:
«Quem ganha, ganha mais coisas. Quem perde, perde mais coisas. Isso é uma verdade palissiana».
José Peseiro, Notícias 24, TVI24, 30 de abril de 2016, 9h07.

No caso em apreço, teria de ser «lapalissada», ou quando muito «lapaliçada», uma vez que a palavra provém do nome do militar francês Jacques II de Chabannes, mais conhecido por Jacques de La Palisse, que também pode ser grafado La Palice. «Lapalissada» designa uma evidência, um truísmo, que terá ficado a dever-se à letra de uma canção composta pelos seus soldados depois da sua morte em batalha, cujo último verso seria: «S'il n'était pas mort, il ferait encore envie»; literalmente, «Se ele não estivesse morto, ainda faria inveja [aos vivos]» e que terá sofrido duas corruptelas:«ferait» ter-se-á transformado em «serait», por causa do «s» longo que se confundia com o «f», e «envie» ter-se-á transformado em «en vie», resultando em: «S'il n'était pas mort, il serait encore en vie», isto é, «Se não estivesse morto, ainda estaria vivo».

No caso, a confusão resulta, por certo, da consideração apenas de «Palice» («palissada») em vez de «La Palice» («lapalissada»).

sábado, 30 de abril de 2016

54. Há e À


«A mim, e só a mim me vincula este sentimento, um pouco paradoxal, se lutarmos até última jornada por este título [...]»
Eduardo Barroso  - «Eu voto não!». A Bola, 27 de abril de 2016, p. 36.

Em «até à última jornada», como em «até à data», ou em «até à noite de ontem», e frases similares, usa-se «à», ou seja, a contração da preposição «a» com o artigo definido «a». «Há» é uma forma do verbo haver, com o sentido de «existir», usada comummente em expressões de tempo, como em: «hoje há aulas», «fui ao Egito há 5 anos», «há já algum tempo que ele não estava bem». Estaria bem se a frase fosse: «Há algumas jornadas o Sporting estava à frente» ou «o Sporting podia ter passado para a frente há umas jornadas». É possível que advenha daqui a confusão...

sábado, 23 de abril de 2016

53. Haverão ou Haverá


Referindo-se a treinadores de futebol:
«Haverão exceções»... «Haverão exceções»
Play-Off, 3 de abril de 2016, 23h05 e 23h06.

A frase foi repetida por duas vezes. Ora, o verbo haver integra os verbos que designam uma ação ou situação à qual não pode ser atribuído um sujeito, tal como acontece com «anoitecer», «chover» ou «fazer» (com sentido de tempo decorrido). No sentido de «existir», «ocorrer», «acontecer», trata-se de um verbo impessoal, ou seja, que não tem sujeito, de onde se conjuga sempre na 3.ª pessoa do singular. Assim: «há pessoas que não sabem o que dizem»; «houve distúrbios na praça»; «haverá problemas»; e, claro, «haverá exceções»...

sexta-feira, 15 de abril de 2016

52. Retrosaria ou Estalagem


Fui ver Os oito odiados, o último filme de Quentin Tarantino. A ação passa-se no Oeste americano, pouco tempo depois da guerra civil, numa estalagem, também com uma componente de venda ou loja, como era comum à época, apelidada no filme de «Minnie's Haberdashery», e que é traduzida por Retrosaria da Minnie. Sendo esse o cenário da maior parte do filme a palavra é por várias vezes referida e por várias vezes o espetador estranha a designação: retrosaria!? É bem certo que «haberdashery» se pode traduzir por retrosaria, mas do que ali estamos a falar é de uma estalagem que acolhe os viajantes, e que me parece teria sido, claramente, a tradução preferível. Ou, quando muito, querendo enfatizar o carácter multímodo do local – e nalgumas (poucas) partes – percebe-se essa característica, designá-lo de venda, a Venda da Minnie, ou loja, a Loja da Minnie. Retrosaria, ademais com o sentido restrito que o termo tem atualmente entre nós, é que não lembra ao demónio… Por sorte ou azar, os estalajadeiros são quase omissos, estando a «retrosaria» entregue a um dos personagens que toma conta dela, mas interrogo-me se, caso existissem e fossem referidos pela função/ocupação, o tradutor os designaria por «retroseiros»?!...

sexta-feira, 8 de abril de 2016

51. Teve ou Esteve


«A diferença teve obviamente na eficácia» 

A declaração do treinador do Braga foi suficientemente pausada para que ele pronunciasse «esteve» e não «teve», e se perceber ou percecionar a sílaba inicial («es-») ou resquício dela, o que não acontece. Não é muito crível que, se fosse na escrita, tal pudesse acontecer, como, aliás, a legenda demonstra, mas que até já li coisa semelhante, já…

A situação, neste caso, agrava-se, porque a ablação da sílaba inicial transforma o pretérito perfeito do verbo «estar» no pretérito perfeito do verbo «ter»...

quarta-feira, 6 de abril de 2016

50. Melhor ou Mais bem


«Os doentes nesses centros [de referência] são melhor tratados […]»; «[…] os profissionais, altamente diferenciados, que estão nesses centros […], são as pessoas melhores preparadas não só para investigar mas também para poder ensinar […]»

Um médico e cirurgião oncológico referiu, numa curta intervenção televisiva, e por duas vezes, as expressões: «melhor tratados» e «melhor preparados». Na segunda vez – pior – até tentou fazer concordar o «melhor» com o sujeito, as «pessoas melhores» para aquela função, o que deveria fazer soar o alarme para este uso espúrio de «melhor».

«Melhor tratado» tal como «melhor preparado» são expressões que continuam a ser usadas com frequência no que me parece ser uma clara manifestação de hipercorreção. E não estão sequer corretas. Melhor é grau comparativo e superlativo de bem quando modifica o verbo em tempos simples, tal como acontece com as frases: «Os centros de referência tratam melhor os doentes do que os hospitais comuns» ou «Os centros de referência portugueses são os melhores da Europa». Mas a anteceder o particípio passado deve-se usar «mais bem», de onde as frases acima transcritas deveriam ficar:
«Os doentes nesses centros [de referência] são mais bem tratados […]»; «[…] os profissionais, altamente diferenciados, que estão nesses centros […] são as pessoas mais bem preparadas não só para investigar mas também para poder ensinar […]».
Se, aliás, pensarmos como foram formados os adjetivos bem-parecido, bem-educado, bem-comportado, bem-visto e tantos outros, em que o elemento bem- integra a sua composição, poderemos, por analogia, eliminar as dúvidas que subsistam relativamente ao uso de melhor e de mais bem.

domingo, 3 de abril de 2016

49. Penaltis ou Penáltis


«[…] a prolongamento ou a penaltis».

TVI24, 24 de março de 2016, 8h41.

Não é assim tão «grave» mas a palavra penálti é uma palavra grave, isto é, com acento tónico na penúltima sílaba. Segundo as regras da acentuação, as palavras graves terminadas em i têm acento gráfico na sílaba tónica, pelo que, naquelas legendas, reproduzindo as declarações do treinador Quinito na homenagem da Associação Nacional de Treinadores de Futebol, teria de ser grafado «penáltis» e não «penaltis».

Foi a angústia do jornalista no momento do penálti…