«Os poltergeist não existem, só nos filmes».
Umberto Eco - Número zero. Lisboa: Gradiva, 2016, 4.ª ed., p. 11.
Eis como a colocação da vírgula pode influenciar o sentido da frase. Com ela, a frase significa que os poltergeist não existem na realidade, mas apenas nos filmes. Sem ela, a frase significa que os poltergeist existem de facto e não apenas nos filmes. Olho para esta frase e lembro-me sempre da «piada» do oposicionista ao Estado Novo que foi surpreendido pela PIDE a grafitar uma parede com a frase:
FORA SALAZAR NÃO FAZ FALTA À NAÇÃO.
Na iminência de ser preso, afirma:
- Esperem, ainda não acabei. E pontua a frase:
FORA SALAZAR? NÃO. FAZ FALTA À NAÇÃO.
Notas de maus usos da Língua Portuguesa seja lá onde for e outras reflexões sobre a mesma...
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quinta-feira, 19 de maio de 2016
segunda-feira, 16 de maio de 2016
60. Vírgula entre o sujeito e o verbo
Os heróis não desistem, insistem!
Mais um dia... Mais desafios!
O despertador tirou-te cedo demais da cama?
O autocarro quis testar as tuas aptidões de velocista?
E os emails, não páram de chegar?
«E os emails, não páram de chegar?» Assim reza o poema acima de um recente anúncio da Actimel, separando por vírgula o que não deve ser separado, ou seja, o sujeito (emails) do verbo (não páram). Acontece demasiadas vezes...
quarta-feira, 6 de abril de 2016
50. Melhor ou Mais bem
«Os doentes nesses centros [de referência] são melhor tratados […]»; «[…] os profissionais, altamente diferenciados, que estão nesses centros […], são as pessoas melhores preparadas não só para investigar mas também para poder ensinar […]»
Um médico e cirurgião oncológico referiu, numa curta
intervenção televisiva, e por duas vezes, as expressões: «melhor tratados» e
«melhor preparados». Na segunda vez – pior – até tentou fazer concordar o
«melhor» com o sujeito, as «pessoas melhores» para aquela função, o que deveria fazer soar o alarme para este uso espúrio de «melhor».
«Melhor tratado» tal
como «melhor preparado» são expressões que continuam a ser usadas com frequência
no que me parece ser uma clara manifestação de hipercorreção. E não estão
sequer corretas. Melhor é grau comparativo e superlativo de bem quando modifica
o verbo em tempos simples, tal como acontece com as frases: «Os centros de
referência tratam melhor os doentes do que os hospitais comuns» ou «Os centros
de referência portugueses são os melhores da Europa». Mas a anteceder o
particípio passado deve-se usar «mais bem», de onde as frases acima transcritas
deveriam ficar:
«Os doentes nesses centros [de referência] são mais bem tratados […]»; «[…] os profissionais, altamente diferenciados, que estão nesses centros […] são as pessoas mais bem preparadas não só para investigar mas também para poder ensinar […]».
Se, aliás, pensarmos
como foram formados os adjetivos bem-parecido, bem-educado, bem-comportado,
bem-visto e tantos outros, em que o elemento bem- integra a sua composição,
poderemos, por analogia, eliminar as dúvidas que subsistam
relativamente ao uso de melhor e de mais bem.
sábado, 27 de fevereiro de 2016
43. Aquela ou Àquela
«Pelo que li, Jorge Ferreira está de consciência tranquila quanto aquela arbitragem que fez no jogo Paços [de] Ferreira-Benfica».
Pedro Marques Lopes, «A procissão e o mordomo Pereira», coluna «Brasão abençoado», A Bola, 26 de fevereiro de 2016, p. 43.
Não é «aquela arbitragem» mas «àquela arbitragem». O árbitro Jorge Ferreira está tranquilo em relação a algo, no caso «a aquela» arbitragem, pelo que aqui teria ocorrer a crase, ou seja, a contração da preposição «a» com o determinante demonstrativo «aquela», originando «àquela». Basta, aliás, e por analogia, pensar que se se tivesse optado por «à» - nunca seria «a» - ter-se-ia igualmente de fazer a contração da preposição com o artigo...
quarta-feira, 28 de outubro de 2015
22. Vão haver ou Vai haver

«Tenho a certeza absoluta que vão haver ainda equipas a perder muitos pontos».
Declarações de Rui Vitória após o Benfica-Sporting, RTP 1, 26 de outubro de 2015.
No domingo o dia correu manifestamente mal a Rui Vitória. Como se não bastasse o resultado do jogo também escorregou na conferência de imprensa. Não pode dizer «vão haver» equipas mas sim «vai haver» equipas. O verbo haver, no sentido de «acontecer ou existir», é impessoal, pelo que se conjuga sempre na terceira pessoa do singular. Neste caso, como é usado com um verbo auxiliar («ir»), é este que tem de ser colocado no singular, concordando assim com o verbo principal («haver»).
segunda-feira, 26 de outubro de 2015
20. Se tratam ou Se trata
«Claro que se tratam apenas de valores indicativos com base nas estimativas do PS [...]»
Expresso, Primeiro Caderno, de 24 de outubro de 2015, p. 5.
O verbo «tratar» sempre que acompanhado da preposição «de» é impessoal, pelo que não se flexiona no plural. No caso vertente não tem de concordar com «valores». A frase correta teria, pois, de ser: «Claro que se trata apenas de valores indicativos com base nas estimativas do PS [...]».
sábado, 17 de outubro de 2015
17. Mais bem ou Melhor
«Os podologistas têm obrigação de estar melhor preparados [...]».
Aqui seria mais correto dizer «mais bem preparado» e não «melhor preparado». «Melhor» é comparativo de «bom»; «mais bem» é comparativo de «bem». Em «bem preparado», o advérbio (bem) faz «corpo» com o particípio passado (preparado). Há mesmo casos em que o advérbio «bem» e o particípio passado se chegam a unir graficamente, através de hífen, como acontece com: bem-fadado, bem-falado, bem-feito, bem-parecido, etc.
quarta-feira, 14 de outubro de 2015
15. Do ou De o (2)
«A hipótese de largar o poder incomoda a Direita, a probabilidade do Bloco ou do PCP participarem numa solução aterroriza-os»
Mariana Mortágua - «Adeus, Passos», Jornal de Notícias, de 13 de outubro de 2015).
Eis mais uma contração indevida do artigo «o» com a preposição «de», resultando em «do». Também aqui a preposição se relaciona com o verbo e não com o substantivo e introduz uma construção com infinitivo (participar), porém flexionado (participarem), sendo o que a distingue da anterior. A contração ali não pode ocorrer.
Quase que poderia jurar que não há vez que «pegue» - ainda que virtualmente - num jornal que não detete este erro...
terça-feira, 13 de outubro de 2015
14. Do ou De o (1)
«A vez do Rui brillhar»
Record, 12 de outubro de 2015, a propósito do jogo Sérvia-Portugal.
Nesta frase a contração do artigo «o» com a preposição «de», resultando em«do», não é correta. Teria de ser «A vez de o Rui brilhar» e não «A vez do Rui brilhar».
Aquela preposição relaciona-se com o verbo e não com o substantivo e introduz uma construção com infinitivo (brilhar), pelo que a contração não pode ocorrer.
É infelizmente um erro muitíssimo comum e que aqui tem honras de título, em letras garrafais, sendo, como tal, (ainda) menos desculpável.
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