quarta-feira, 30 de setembro de 2015

9. Dantesco por Gigantesco


«É certo que este Chelsea não se recomenda, tendo ontem sofrido a quinta derrota em onze encontros oficiais na época mas sempre tem um naipe de estrelas que torna dantesca a tarefa de os bater. 
E dantesco foi o FC Porto».
Metro, 30 de setembro de 2015.

A tarefa de derrotar o Chelsea não foi dantesca, nem o FC Porto ontem foi dantesco. Tarefa e clube poderão ter sido gigantescos ou gigantes; colossais ou imensos. Dantescos, nunca! Dantesco é horroroso, pavoroso, horrível, diabólico, medonho. Custa-me a aceitar como num jornal se podem utilizar palavras com tamanho desconhecimento do seu sentido.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

8. Vernáculo = Palavrão


«Quando pergunto à cofundadora da associação britânica Women in Football (Mulheres no Futebol) se sabe português, ela diz que não. Mas rapidamente reconsidera. "Well... filha da puta?" Diz-se que o vernáculo é das primeiras coisas que se aprende numa língua estrangeira [...]»
Expresso, Primeiro Caderno, 26 de setembro de 2015, p. 39.

Já tinha constatado esta evolução semântica, mas porventura nunca de forma tão clara. Aqui vernáculo é igual a palavrão. 
A palavra vernáculo é utilizada para designar o que é nacional, próprio de um país, e, no caso da língua, o idioma no seu estado mais puro, sem estrangeirismos. 
Quando a aprendi era usada para se referir ao idioma nacional, em casos como: «antes do Vaticano II, a missa era rezada em latim, depois passou a vernáculo». Mas era sobretudo utilizada para se referir à linguagem tida como antiquada, caída em desuso, em casos como: «o autor X utiliza demasiado vernáculo». Nesta aceção, tinha uma conotação pejorativa, e era quase equivalente a «castiço» ou até mesmo «possidónio».  
Depois evoluiu para se referir a expressões coloquiais e/ou calão. E agora parece também ser igual a palavrão, como o prova à saciedade a citação acima.

sábado, 26 de setembro de 2015

7. Irá se ou Ir-se-á


«Bom, tive um convite da concorrência para voltar às novelas que provavelmente irá se consumar lá para o final do ano»
Diogo Infante, Grande Entrevista, RTP  Informação, 23 de setembro de 2015, 51m40.

As nódoas caem em todos os panos e na oralidade ainda mais. Foi o que aconteceu com este «irá se». Se a frase fosse negativa - «não se irá consumar»; interrogativa - «onde se irá consumar?»; ou exclamativa - «não sei quando se irá consumar!», estaria perfeito. Sendo afirmativa, não está. Para o caso teríamos duas alternativas: «ir-se-á consumar» - num registo mais cuidado - ou «irá consumar-se» - num registo mais informal. «Irá se consumar» é que não!

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

6. «Stores» em vez de lojas


«Disponível nas stores para iOS e Android [...]»
Folheto de divulgação do Euroticket, distribuído com o jornal Metro de 24 de setembro de 2015.

Não convivo mal com estrangeirismos, em casos de ausência de alternativa ou de alternativa débil em vernáculo. Ou até mesmo por fluidez. Há casos que por estarem tão generalizados, a tradução forçada representa um tropeção quando se lê. Às tantas por purismo ou defesa da língua cai-se num certo possidonismo. Mas há outros?!... Veja-se este? Que diabo, porque não «lojas» ou «lojas online» - concedo até - em vez de «stores»?!... E ademais «stores» sem itálico, como se a palavra já estivesse consagrada na Língua Portuguesa... Passaria incólume com uma destas formulações: «Disponível para iOS e Android nas respetivas App Stores» ou «Disponível nas App Stores para iOS e Android»... Assim, não...

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

5. Salamizar




«E aponta o dedo aos responsáveis: o governo, que desmembrou a CP e a retalhou às peças. Ou melhor, “decidiu salamizá-la”. Cortou-a em fatias? É isso. A companhia ficou em tiras. Jerónimo, mais uma vez, ganhou na arte do improviso».
Jerónimo de Sousa, cit. pelo Expresso online, de 22 de setembro de 2015.

Salamizar v. (2015) Cortar às fatias. Etim. - De salame.

Está bem formada, a partir de «salam-» + «-izar». É expressiva e compreensível. O que se pode exigir mais?

P.S. - Ainda que não ao verbo, encontram-se referências anteriores ao substantivo «salamização», a mais antiga de 1978como uma simples pesquisa no Google facilmente demonstra. Registe-se que nesta notícia o Expresso foi sensível à palavra referindo em título «
Um novo verbo: “salamizar”», e depois em destaque: «Jerónimo esteve no Entroncamento, na sua primeira arruada. Foi curta e breve. No final, falou diretamente ao coração dos ferroviários e criou para eles um neologismo. Diz que o Governo está a “salamizar a CP”».

terça-feira, 22 de setembro de 2015

4. Alpinista social vs Elevador social

Um dia destes num daqueles programas da manhã na televisão surpreendi o uso da expressão «alpinista social». É uma expressão de valor negativo que pretende significar alguém que ascendeu socialmente não por mérito próprio, mas à sombra de outros. Não deixei de meditar na contradição entre a expressão «alpinista social» e o valor referencial da palavra «alpinista», isto é, alguém que atinge o topo das montanhas firmado no seu próprio esforço. 
Por associação de ideias, lembrei-me da expressão «elevador social», usada comummente em análises sociológicas, com valor positivo, para significar um indivíduo ou grupo que, mercê do seu esforço, consegue ascender socialmente. 
Em suma, e referencialmente, o «alpinista» sobe com o esforço próprio; quem sobe através do «elevador» fá-lo com o esforço da máquina. 
Não deixei de tirar a bissetriz: seria porventura mais lógico, atento o valor referencial dos substantivos «alpinista» e «elevador», a que depois se juntou o adjetivo «social», que «alpinista social» fosse a expressão de valor positivo e «elevador social» fosse a expressão de valor negativo. Mas não é. 
Assim é o curso das palavras...

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

3. Balneário ou Vestiário. Relvado ou Gramado

«É verdade, fiquei com muitas palavras daí, foram seis anos. Aqui com os brasileiros às vezes digo "vou para o balneário", e aí eles "qual balneário?" [risos]. Ou então digo relvado em vez de gramado. Manias de Portugal».
Expresso, Primeiro Caderno, 19 de setembro de 2015, p. 38.

Eis um excerto de uma entrevista ao antigo jogador do Benfica, Lima, que mostra bem as diferenças vocabulares entre o português de Portugal e do Brasil, aqui numa área específica, o futebol. Por lá, como sublinha Lima, balneário é vestiário e relvado é gramado. Além de equipa ser time, adepto ser torcedor, taça ser copa, e tantas outras.

domingo, 20 de setembro de 2015

2. A moral ou O moral

«O Benfica vai ao Dragão com a moral em alta»
RTP 1, Bom dia, Portugal, 20 de setembro de 2015, 8h40.

Este erro é já um clássico tal a frequência com que ocorre. É muito comum ouvir-se expressões como «levantar a moral», «a moral das tropas», e afins. Nesta aceção, como na da frase acima, teria de ser «o moral» - substantivo masculino - que significa «estado de espírito, ânimo» - e não «a moral» - ou seja, os princípios e os valores que regem a conduta do homem».

Moral da história: atenção ao género do substantivo sempre que falamos de moral...

sábado, 19 de setembro de 2015

1. Estrear pela primeira vez

«Hoje a equipa do Astana estreia-se pela primeira vez na Liga dos Campeões»
TSF, Jornal de Desporto, 15 de setembro de 2015, 8h30.

A frase pareceu-me ter sido previamente escrita e depois lida. Mas quem a leu apercebeu-se e corrigiu «na passada», referindo, e cito de memória: «claro que se se estreia, é pela primeira vez»... Obviamente...
Na mesma linha de «entrar para dentro» ou «sair para fora», «subir para cima» ou «descer para baixo», e tantos outros, este é mais um pleonasmo vicioso, sempre de evitar...